Aviso aos nossos inimigos:

"Pereçam miseravelmente aqueles que pensam que estes homens fizeram ou sofreram algo vergonhoso." (Filipe II da Macedônia sobre o Batalhão Sagrado de Tebas, o Exército de Amantes)

23 julho 2019

Androfilia Zodiacal: Leão

Homossexualidade, Astrologia, Zodíaco, Mitologia, Leão
Leão na Uranografia de Johannes Hevelius (1690)
 Chegou a hora do artigo especial sobre a androfilia do signo de Leão, o quinto dos signos do Zodíaco (as datas de início e fim de cada signo são as do período 2019-2020, pois as datas podem variar levemente a cada ano). Um alerta: aqui não tratarei dos aspectos astrológicos dos signos; quem quiser saber como cada signo é no amor, no sexo, no beijo, etc, o que não faltam são milhares e milhares de sites (literalmente) sobre o assunto. Então eu só faria chover no molhado (além de que eu não sou astrólogo).

Leão
(23/07 a 23/08)

Leo é o nome latino da constelação de Leão. Para os antigos gregos ela representava o Leão de Nemeia, morto pelo mítico herói Héracles (Hércules) como o primeiro dos seus Doze Trabalhos. Uma das 48 constelações descritas pelo astrônomo Ptolomeu do século 2, Leão permanece como uma das 88 constelações modernas, e uma das mais facilmente reconhecíveis devido às suas muitas estrelas brilhantes e a um distinto formato que verdadeiramente lembra o de um leão.

História & Mitologia
Constelação de Leão
(com Júpiter logo abaixo)
Leão é uma das constelações mais antigas reconhecidas, com evidência arqueológica de que os mesopotâmios tinham uma constelação similar em 4.000 AEC. Os persas a chamavam Ser ou Shir; os turcos, Artan; os sírios, Aryo; os judeus, Arye; os indianos, Simha — todos significando "Leão".

Alguns mitologistas acreditam que, na Suméria, Leão representava o monstro Humbaba, que tem a face de um leão e foi morto por Gilgamesh. (para saber sobre o homoerotismo no mito de Gilgamesh na astronomia, veja o artigo sobre a androfilia zodiacal de Touro)

Na astronomia babilônica, a constelação era chamada UR.GU.LA, o "Grande Leão"; a estrela Regulus era conhecida como "a estrela que fica no peito do Leão", representando o Coração do Leão. Regulus, cuja palavra significa "Príncipe" ou "Pequeno Rei", tinha também distintivamente associações régias, pois era conhecida como a Estrela Rei.

Homossexualidade na Grécia Antiga - Héracles Hércules e o Leão de Nemeia
Héracles e o Leão de Nemeia (pinturas em cerâmicas gregas)
Homossexualidade na Grécia Antiga - Jovem Héracles Hércules com a pele do Leão de Nemeia
Hércules segurando a pele
do Leão de Nemeia, séc. 1 EC
Na mitologia grega, como já dito, Leão era identificado como o Leão de Nemeia, que foi morto por Hércules nos seus Doze Trabalhos. O Leão de Nemeia era invulnerável a qualquer arma; assim, para vencê-lo, Hércules teve que usar as mãos nuas e sua incrível força física, estrangulando o leão. Zeus, pai de Hércules, comemorou o feito colocando o leão no céu. Uma curiosidade que muita gente deixa passar: durante o combate corpo a corpo, o leão arrancou um dos dedos do herói com uma mordida. E, para esfolar o leão e usar a sua pele como couraça impenetrável, Hércules só conseguiu cortá-la usando as próprias garras do animal, por sugestão de Atena.

Os romanos a chamavam Herculeus Leo (Leão de Hércules);  Violentus Leo (Leão Violento); Bacchi Sidus (Estrela de Baco, já que Baco/Dioniso era às vezes identificado com esse animal, entre outros grandes felinos); e Jovis et Junonis Sidus (Estrela de Jove/Júpiter e Juno).

Ideal de Masculinidade
Homossexualidade na Grécia Antiga - Hércules com a pele do Leão de Nemeia - Hércules, de Silvio Canevari (1931), Stadio dei Marmi, Roma
Hércules,
de Silvio Canevari (1931).
Stadio dei Marmi, Roma
Héracles ou Hércules, em cuja homenagem foi criada a constelação zodiacal de Leão, é o maior dos heróis da mitologia grega, o modelo ideal de masculinidade, ancestral dos clãs reais que afirmavam ser Heráclidas ("descendentes de Héracles") e o campeão da ordem olímpica contra os monstros ctônicos. Entre os seus títulos e atributos estão o de guardião do Olimpo e deus da força, dos heróis, dos esportes, dos atletas, da saúde, da agricultura, da fertilidade, do comércio, dos oráculos e divino protetor da humanidade, com especial proteção sobre o gênero masculino. Vivendo entre os deuses no Monte Olimpo após a sua apoteose, os seus símbolos são a maça (clava), a pele do Leão de Nemeia e o arco e flechas.

Homossexualidade na Grécia Antiga - Hércules Farnese
Hércules Farnese (216 EC;
o original é do séc. 6 AEC)
Hércules nasceu em Tebas, a principal cidade-estado da Beócia, região famosa por sua prática da pederastia, que consistia em relacionamentos amorosos socialmente reconhecidos entre homens, usualmente um adulto e um adolescente (mas que, diferente de outras regiões da Grécia, podia continuar na vida adulta), uma tradição consagrada no próprio mito fundador da cidade. Muitos personagens da região, míticos e históricos, são homens andrófilos, como o rei Laio, o caçador Narciso, os heróis Hércules e Iolaus, o general Epaminondas (considerado o maior homem grego da antiguidade) e o renomado Batalhão Sagrado de Tebas (formado por 300 guerreiros de elite, 150 casais masculinos que eram considerados invencíveis; aliás, no túmulo conjunto do Batalhão Sagrado em Queroneia, na Beócia, foi erigido um leão gigante de pedra conhecido como o Leão de Queroneia). Além de tudo isso, a Beócia tinha Eros, em seu aspecto de deus primordial, como a sua divindade de maior adoração; em muitos aspectos, como se sabe, Eros tem especial poder sobre o amor entre homens e é um dos patronos da pederastia em toda a Grécia, ao lado de Hermes e, como não poderia deixar de ser, de Hércules.

Homossexualidade na Grécia Antiga - Hércules e o Leão de Nemeia (arte de Miguel Coimbra)
Hércules e o Leão de Nemeia (arte de Miguel Coimbra)
Homossexualidade na Grécia Antiga - Hércules Farnese
Hércules Farnese (visão traseira porque sim)
Como símbolo de masculinidade e do ideal guerreiro, Hércules teve muitos amantes masculinos. Plutarco, em seu Erotikos, sustenta que os homens que Hércules amou eram simplesmente incontáveis. Em um momento mais oportuno farei artigos próprios sobre cada um desses amores masculinos do maior herói de todos os tempos, assim como um artigo especial sobre a pederastia na Grécia; são desejos muito antigos meus.

Sol, o regente de Leão
O Sol, ou aspectos dele, é representado por divindades masculinas e femininas que evidenciam o seu poder e a sua força. Deidades solares e o culto ao Sol podem ser encontrados por toda a história humana em várias formas.

Leão e Sol (símbolo do Irã, antiga Pérsia)
Leão e Sol (símbolo do Irã, antiga Pérsia)
No Egito, Atum é o deus criador de caráter solar que se masturbou e literalmente ejaculou o Universo. Segundo a religião egípcia, o atual regente divino do cosmos é Hórus, jovem deus-sol que, como já vimos aqui mesmo no blog, é um importantíssimo deus andrófilo e amante do seu tio e rival Set. Falando deus-sol, lembremos de Rá, que também já foi mostrado aqui no blog como o Faraó Neferkare e o General Sasenet mantinham um romance secreto e eram referenciados respectivamente como os deuses Rá e Osíris.

Homossexualidade na Grécia Antiga - A Queda de Faéton, de Gustave Moreau
A Queda de Faéton,
de Gustave Moreau (1878).
Note a constelação de Leão no alto
Na Grécia, dois dos mais importantes deuses são associados ao sol: Hélio e Apolo, ambos andrófilos, cujas irmãs gêmeas, Selene e Ártemis, são associadas à Lua. Faéton (ou Faetonte), filho de Hélio e que provocou destruição por onde passou com a carruagem solar mal conduzida por ele, era um jovem amado pelo rei Cicno, que lamentou a sua morte. No mito da criação da humanidade descrito por Platão e por Aristófanes, os homens que amam homens, que originalmente eram as criaturas duplas cujos indivíduos eram conhecidos simplesmente como "homem", descendem do Sol, enquanto a "mulher" (as mulheres que amam mulheres) descendem da Terra e o homem-mulher (os andróginos, depois separados em homens e mulheres que amam o sexo oposto) descendem da Lua.

Homossexualidade na Roma Antiga - Elagábalo, Sumo Sacerdote do Sol (Simeon Solomon, 1866)
Elagábalo, Sumo Sacerdote do Sol
(Simeon Solomon, 1866)
Durante o Império Romano, o festival que celebrava o aniversário de (re)nascimento (Dies Natalis ou "Dia Natal") do Sol Invicto marcava o solstício de inverno, que no calendário juliano caía no dia 25 de dezembro. Com a dominação cristã no mundo romano, a data foi suplantada pelo aniversário de Cristo, também conhecido como "Natal" assim como o era para o Sol Invicto. Elagábalo, o jovial imperador andrófilo (e afeminado) de origem síria, durante o seu governo negligenciou os deuses romanos e promoveu o deus-sol sírio também chamado Elagábalo (Elagabalus, Aelagabalus, Heliogabalus ou Ilāh hag-Gabal, "o Deus da Montanha") como a divindade mais poderosa de Roma.

Ainda durante o Império Romano, o Mitraísmo, também conhecido como Mistérios Mitraicos ou Culto de Mitra, era uma religião exclusiva para homens, com a presença maciça, mas não só, de soldados do militarismo romano, que se reuniam em templos subterrâneos chamados mitraeus. A segunda cena mais importante do culto é a do Banquete com o Sol. Nas imagens representando o banquete, o deus romano Sol, completamente nu, senta-se reclinado sobre o colo de um Mitra também nu, que "veste" apenas uma capa sobre os ombros e um chapéu e o abraça pelos ombros, e ambos estão sentados sobre a pele do touro que Mitra matou em sua mais importante cena da religião, a Tauroctonia (a "Matança do Touro"). A homossocialidade exclusivamente masculina do Mitraísmo tem atraído um grande número de pagãos modernos que preferem o conforto e a liberdade da intimidade masculina (a maioria deles, claro, são homens que amam homens), especialmente quando lembramos que o romano Mitra compartilha a mesma origem mitológica do deus hindu Mitra, deus da amizade, dos juramentos e do Sol da manhã, que vive um relacionamento sexual com outro deus masculino, Varuna, deus da água, da chuva, do oceano, do anoitecer e da justiça. O Mitra romano originou-se do deus persa do Sol, da luz, dos juramentos e da justiça também chamdo Mitra, e, junto com o hindu Mitra, todos são derivados do antiquíssimo deus indo-iraniano Mitra, cuja etimologia do nome significa "pacto, tratado, acordo, promessa" e, consequentemente, também "amigo".
Homossexualidade na Roma Antiga - Mitraísmo, Banquete de Mitra e o Deus Sol (130 EC)
Banquete de Mitra e o Deus Sol (130 EC)
Bom, aí está, pessoal. Espero que tenham gostado desse artigo especial. Adorei me aprofundar nos mitos andrófilos do Sol, poderoso deus-pai dos homens que amam homens que está sempre em meus pensamentos e agradecimentos, e nunca me canso de trazer mais materiais sobre Hércules, que eu amo de paixão e tenho como meu modelo de homem, de guerreiro e de herói.

Homossexualidade na Grécia Antiga - Hércules e o Leão de Nemeia
Hércules e o Leão de Nemeia (teto da Villa Farnesina, Roma)
Até o próximo artigo desta série, com a androfilia do signo de Virgem!

2 comentários:

Luã disse...

Amei o seu blog, e saber que existe todo um lado mitológico e até sagrado sobre um aspecto humano que por tanto tempo foi tratado de maneira erronea como abominação e pecado. É um lufada de ar fresco e uma nova e bem vinda visão sobre a homosexualidade

Fábio Máximo disse...

Oi, Luã! É justamente por isso tudo o que você falou que eu criei este blog. Precisamos combater a mentirosa ideia de que homo-bi-trans-inter-assexualidade é incompatível com religião e espiritualidade. Praticamente todas as sociedades do passado e do presente (mesmo que a maior parte do mundo hoje em dia seja abraâmica) nos trazem uma visão bem diferente de nossas sexualidades e identidades, algumas vezes até as sacralizando e divinizando.
Precisamos resgatar isso, pois temos o mesmo direito ao sagrado que qualquer outra pessoa, e de não sermos tratados como pecadores e abominações que merecem ser mandados para o inferno.
Muito obrigado pela sua visita e seu comentário. Sinta-se sempre à vontade para retornar e comentar novamente.
Um grande abraço.

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