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Rá em sua barca solar |
A antiga história egípcia do
Rei Neferkare e do
General Sasenet sobrevive apenas em fragmentos. Com a sua atmosfera de mistério noturno e intriga, é dos primeiros exemplos da tradição literária de "capa e espada". Ela é frequentemente citada por pessoas interessadas em homossexualidade e em sua história como sendo prova de que uma relação do mesmo sexo existiu entre um faraó e um dos seus oficiais. Por outro lado, a literatura reflete frequentemente costumes sociais: o conto é uma censura da conduta do rei, que bem pode refletir a atitude das pessoas em relação à homossexualidade.
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Pepi II num baixo-relevo em sua pirâmide em Saqqarah |
A história é datada do final do Novo Império, apesar de ter sido composta antes e se propõe a descrever as aventuras noturnas do Faraó
Pepi II Neferkare (6ª Dinastia, século XXIII AEC); alguns, como R. S. Bianchi, acham que é uma obra de literatura arcaizante (escrita num estilo anterior ao período em que foi feita) e data para bem mais recente, na 25ª Dinastia (séculos VIII e VII AEC), referindo-se a
Shabaka Neferkare, um faraó cuxita (isto é, originiário do Reino de Cuxe [ou Kush], ao sul do Egito antigo [entre o sul do Egito e o norte do Sudão atuais]).
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Gigante Rá-Osíris, os dois deuses fundidos num só. Sarcófago de Tutancâmon |
Ela contém uma referência ao antigo mito do deus do Sol,
Rá ou
Rê, e o deus do reino dos mortos,
Osíris. Estes dois deuses existem numa relação de interdependência: Osíris precisa da luz do Sol enquanto Rá, que tem que cruzar o submundo durante a noite para alcançar o horizonte leste pela manhã, precisa dos poderes de ressurreição de Osíris (quando Rá está no mundo inferior, ele funde-se com Osíris, o deus dos mortos, e por isso se torna o deus dos mortos também). Sua união tem lugar durante as quatro horas de profunda escuridão — as mesmas horas que Neferkare passava com seu general.
O
Faraó Neferkare (
Pepi II) e
Sasenet (ou
Sisene), um comandante militar, viveram durante a 6ª Dinastia (2460-2200 AEC) no Antigo Império. Conhecidos de três cópias fragmentárias, desde as 19ª–25ª Dinastias (1295-656 AEC), este texto provavelmente também originou-se mais cedo e tinha uma longa história de leitura. Embora o início do texto esteja danificado, há uma referência a Sisene divertindo o rei "porque não havia nenhuma mulher [ou esposa] lá com ele"; e a palavra "amor [desejo]" é mencionada na linha acima.
Um pouco mais adiante, lemos que
Teti, um plebeu, viu "a divina pessoa do Rei do Alto e do Baixo Egito, Neferkare, sair durante a noite para caminhar sozinho... Teti disse a si mesmo, 'Se este for o caso, então é verdade o que é dito sobre ele, que ele sai durante a noite.' ... [Então, Teti seguiu o rei, que] chegou à casa do General Sasenet. Ele jogou uma pedra e bateu o pé, ao quê uma [escada] foi descida para ele. Ele subiu, e Teti filho de Henet esperou... Quando sua divina pessoa tivesse feito o que queria com [o general], ele retornou ao palácio, e Teti filho de Henet o seguiu..."
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Osíris e Rá |
Teti então observa que o rei foi para a casa do general à quarta hora da noite [22:00] e passou quatro horas lá. Este conto salienta a natureza clandestina do romance, aponta para rumores circulando de uma "caçada" noturna do rei e aprimora o sigilo do romance descrevendo o rei sumindo para encontrar-se na casa do general. Embora a narrativa implique uma censura da homossexualidade, Neferkari não é criticado por fazer sexo com outro homem, mas por ser um mau governante."
Alguns egiptólogos sugeriram que este fragmento (incluindo o romance) transmite uma atmosfera de "corrupção real", ainda que a descrição em si seja bastante neutra em tom e sem julgamento. Ainda assim, contemporâneos podem ter considerado tal atividade por parte de um rei, que era uma encarnação da divindade, como indigna e inapropriada. Ademais, o faraó evidentemente tinha desejos homossexuais fortes o suficiente para que encontrasse um amante secreto e uma maneira noturna de satisfazê-los alegremente, pelo menos até ele ser descoberto.
Fonte 1Fonte 2Texto completo (em inglês)
P.S.: O nome Neferkare (Nefer-Ka-Re) significa "Belo é o Ka de Rê (Rá)". Ka é uma das muitas partes da alma (tanto a divina como a humana), de acordo com a antiga espiritualidade egípcia, e representa a essência vital. (
Wikipedia)
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