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"Pereçam miseravelmente aqueles que pensam que estes homens fizeram ou sofreram algo vergonhoso." (Filipe II da Macedônia sobre o Batalhão Sagrado de Tebas, o Exército de Amantes)

19 julho 2024

Jacinto e Apolo... e Zéfiro... e Bóreas... e Tâmiris...

A Morte de Jacinto, The Death of Hyacinthos, 1801, Jean Broc

 Há muito tempo eu queria escrever esse artigo sobre Jacinto, o maior amor do deus Apolo, o primeiro mito sobre o amor entre dois homens que eu conheci. E este fim de semana é perfeito para isso, e vocês entenderão por quê.

Jacinto (grego antigo: Ὑάκινθος, Hyákinthos) é um herói divino e amante de Apolo na mitologia grega. Seu culto em Amíclai (Amyclae), 5 quilômetros a sudoeste de Esparta, data da era micênica. O herói está miticamente ligado aos cultos locais e identificado com Apolo. No período clássico, um temenos, ou santuário, cresceu em torno do que se dizia ser o seu túmulo, localizado aos pés de uma colossal estátua de Apolo.

Família

Jacinto montado no cisne de Apolo; Hyakinthos on swan. Attic Red Figure Kylix. Attributed to Apollodoros. 500-490 BCE
Jacinto recebeu vários parentescos, fornecendo ligações locais, como filho da musa Clio e do rei Piero da Magnésia, ou do rei Ébalo de Esparta, ou do rei Amiclas de Esparta, progenitor do povo de Amíclai, no reino da Lacedemônia, cuja capital era Esparta. Sendo o filho mais novo e mais bonito de Amiclas e Diômede, filha de Lápites, Jacinto era irmão mais novo de Cinortas, Árgalo, Polibeia, Laodâmia (ou Leanira), Hárpalo, Hegesandra e, em outras versões, de Dafne, também amada por Apolo (aquela que foi transformada em loureiro). Se ele era filho de Clio e Piero, Jacinto tinha como irmão a Rago (Rhagus).

Em sua filiação mais conhecida, Jacinto pertencia à Família Real de Esparta, já que seu pai, Amiclas, foi rei de Esparta e fundador da cidade de Amíclai. Amiclas era filho do rei Lacedêmon e da rainha Esparta, que deram seus nomes ao reino da Lacedemônia e à capital Esparta, na antiga Lacônia. Amiclas foi também irmão da rainha Eurídice de Argos, mãe de Danae, avó de Perseu e ancestral de Héracles (Hércules) — não confundir com Eurídice, amada de Orfeu.

Como filho de Amiclas, Jacinto também é conhecido como Amíclides ou Jacinto Amíclides.

Mitologia

Na mitologia grega, Jacinto era um príncipe espartano de notável beleza e amante do deus Apolo. Ele também era admirado por Zéfiro, o deus do vento oeste, Bóreas, o deus do vento norte, e por um homem mortal chamado Tâmiris. Jacinto escolheu Apolo em detrimento dos outros. Ele visitava todas as terras sagradas de Apolo com o deus em uma carruagem puxada por cisnes. Apolo estava tão apaixonado por Jacinto que abandonou seu santuário em Delfos para desfrutar da companhia do príncipe espartano às margens do rio Eurotas. Ele ensinou a Jacinto o uso do arco e da lira, a arte da profecia e exercícios no ginásio. "O amor que meu pai tinha por você era mais profundo do que ele sentiu por outros", cantou Orfeu, filho de Apolo, no poema Metamorfose 10.162, de Ovídio.

Zephyrus and Hyacinth, around 490–485 BCE;

Um dia, Apolo estava lhe ensinando o jogo do disco. Eles decidiram fazer uma competição amistosa, revezando-se no lançamento do disco. Apolo lançou primeiro, com uma força tão grande que o disco espalhou as nuvens no céu. Ansioso para recuperar o disco, Jacinto correu atrás dele para pegá-lo. Mas ao atingir o solo, o disco ricocheteou, acertando a cabeça de Jacinto e ferindo-o mortalmente. Uma versão alternativa do mito responsabiliza Zéfiro pela morte de Jacinto. Com ciúmes de que Jacinto preferia o radiante Apolo, Zéfiro assoprou ruidosamente o disco de Apolo para matar Jacinto.

A Morte de Jacinto, The Death of Hyacinthos, 1801, Jean Broc
O rosto de Apolo ficou pálido enquanto ele segurava seu amante moribundo nos braços. O deus da medicina usou todos os tipos de ervas e até tentou dar ambrosia para curar a ferida de Jacinto, mas foi inútil, pois ele não conseguiu curar a ferida infligida pelas Moiras. Apolo chorou pela morte de Jacinto e expressou seu desejo de se tornar um mortal para se juntar ao jovem espartano em sua morte. Sendo isso inatingível por causa de sua imortalidade, Apolo prometeu que sempre se lembraria de Jacinto por meio de suas canções e da música de sua lira. Ele criou uma flor com o sangue derramado de Jacinto, o jacinto, e escreveu em suas pétalas as palavras de lamentação, "AI AI", ou "Y", a primeira letra do seu nome em grego. No entanto, com base em sua descrição antiga, a flor em que Jacinto se transformou não é a planta moderna com esse nome, mas alguma outra (ver mais abaixo, em "Atributos").

A Biblioteca de Pseudo-Apolodoro conta que o cantor trácio Tâmiris também se apaixonou por Jacinto, sendo o primeiro homem mortal a amar outro homem. Quando suas canções não conseguiram conquistar o amor de Jacinto contra Apolo, ele desafiou as nove Musas para uma competição e perdeu, e estas lhe tiraram os poderes divinos da música e do tocar a lira.

Apoteose e Jacíntia

Eventualmente, segundo a Dionisíaca de Nono de Panópolis, Jacinto acabou sendo ressuscitado por Apolo e alcançou a imortalidade. Pausânias registrou em Descrição da Grécia que o trono de Apolo feito por Báticles de Magnésia em Amíclai mostrava uma imagem esculpida de Jacinto mais crescido e com barba sendo levado ao céu junto com sua irmã Polibeia por Afrodite, Atena e Ártemis:

"No altar também estão Deméter, a Donzela [Perséfone], Plutão [Hades], ao lado deles Destinos [Moiras] e Estações [Horas], e com eles Afrodite, Atena e Ártemis. Elas estão levando para o céu Jacinto e Polibeia, a irmã, dizem, de Jacinto, que morreu donzela. Agora, esta estátua de Jacinto o representa barbado, mas Nícias, filho de Nicomedes, pintou-o no auge da beleza juvenil, insinuando o amor de Apolo por Jacinto, de que fala a lenda."

Apolo e Jacinto; Hyacinth Borne to the Heavens by Apollo with satyrs, 1597, Annibale Carracci, Farnese Gallery, Rome

Jacinto era a divindade tutelar de um dos principais festivais espartanos, a Jacíntia, celebrado no mês espartano Jacíntio (Hyakínthios), o primeiro do calendário lacônio, no início do verão no hemisfério norte, em julho. O festival durava três dias, um dia de luto pela morte de Jacinto, e os dois últimos celebrando seu renascimento, embora a divisão de honras seja objeto de controvérsia acadêmica. No primeiro dia, o povo lamentava a sua morte comendo o mínimo possível e abstendo-se de entoar canções, ao contrário de todas as outras festas de Apolo. No segundo dia, coros de meninos e rapazes cantavam algumas das suas canções nacionais e dançavam. Quanto às meninas, algumas eram transportadas em carroças de vime decoradas e outras desfilavam em carruagens puxadas por dois cavalos, nos quais corriam. Os cidadãos entretinham seus amigos e até mesmo seus próprios servos. Todos os anos, as mulheres lacônias teciam um quíton para Apolo e o apresentavam a ele, uma tradição semelhante ao peplos oferecido a Atena em Atenas por ocasião dos Jogos Panatenaicos. Menos se sabe sobre o terceiro dia, indicando que provavelmente mistérios eram realizados. É descrito como "festival da meia-noite alegre".

Amíclai, Amiclea, Santuário de Jacinto e Apolo Amicleu, Sanctuary of Hyacinthus and Amyclean Apollo
Se a Jacíntia ainda fosse celebrada hoje, neste ano de 2024 aconteceria neste fim de semana, entre sexta-feira e domingo, 19 a 21 de julho, terminando na primeira noite de lua cheia do calendário lacônio. Leia meu artigo especial sobre a Jacíntia para conhecer melhor esse importante festival.

Esta festa era tão importante que os amicleanos, mesmo quando entravam em batalha contra um inimigo, voltavam sempre para casa quando se aproximava a época da Jacíntia, e os lacedemônios certa vez estabeleceram uma trégua de quarenta dias com a cidade de Eira apenas para poder voltar para casa e celebrar a festa nacional. Após o tratado com Esparta, em 421 AEC, os atenienses, para mostrar sua boa vontade para com Esparta, prometeram todos os anos comparecer à celebração da Jacíntia.

Cultos e Atributos

Jacinto tinha um santuário em Amíclai, que passou a compartilhar com Apolo. Vários estudiosos concordam que Jacinto era um deus da natureza pré-helênico, e certos aspectos de seu próprio culto sugerem que ele era uma divindade da vegetação ctônica cujos cultos foram fundidos com os de Apolo. Nilsson diz que Hyacinthus é uma palavra cretense, e sua origem pré-helênica é indicada pelo sufixo -nth. Jacinto personifica a vegetação que brota na primavera, que é morta pelo calor do verão. A apoteose de Jacinto indica que, após atingir a divindade, ele representa o ciclo natural de decadência e renovação.

Apolo Jacíntio; Apollon Hyacinthios kneeling, holding hyacinth and lyra - inscription TARAS (Tarentum), ca 510-500 BCE
O fato de que em Tarento, no sul da Itália, uma tumba de Jacinto seja atribuída por Políbio a Apolo Jacinto levou alguns a pensar que as personalidades são uma só e que o herói é apenas uma emanação do deus; a confirmação é buscada na denominação apolínea τετράχειρ (tetrácheir, quadrúmano, que tem quatro mãos/braços), alegada por Hesíquio como tendo sido usada na Lacônia, e supostamente descreve uma figura composta de Apolo-Jacinto. Contra esta teoria está a diferença essencial entre as duas figuras. Jacinto é um deus ctônico da vegetação cujos adoradores estão aflitos e tristes; embora interessado na vegetação, a morte de Apolo não é celebrada em nenhum ritual, sua adoração é alegre e triunfante e, finalmente, o Apolo Amicleu é especificamente o deus da guerra e da música. Além disso, Pausânias descreve o monumento em Amíclai como consistindo de uma figura rude de Apolo em pé sobre uma base em forma de altar que formava o túmulo de Jacinto. Nesse altar, as oferendas eram colocadas para o herói antes que os presentes fossem dados ao deus.

Jacinto e Apolo; Hyacinthus meeting Apollo (not seen here) in a biga drawn by swans, Etruscan oinochoe, ca 380-360 BCE
Jacinto foi presenteado com uma carruagem de cisnes por Apolo e aparecia nas artes antigas montando-a, seja para encontrar Apolo ou para escapar dos avanços de Zéfiro. Acreditava-se que os cisnes eram os aves da Hiperbórea ("além do norte"), uma terra mística de eterna primavera e imortalidade, para onde o próprio Apolo viajava todo inverno em uma carruagem puxada por cisnes. Esta associação de Jacinto com cisnes o coloca em estreita ligação com Apolo Hiperbóreo e a primavera. Sugere-se que Jacinto teria passado os meses de inverno no submundo, ou mais adequadamente em Hiperbórea junto com Apolo e retornando à terra na primavera, quando a flor do jacinto desabrocha.

Segundo as interpretações clássicas, seu mito é uma metáfora da morte e do renascimento da natureza. O festival da Jacíntia incluía ritos iniciáticos, ou seja, a iniciação dos jovens rapazes à idade adulta.

Atributos

Diz-se que a flor do jacinto que surgiu do sangue de Jacinto tinha uma tonalidade azul profunda, púrpura ou roxa e um sinal semelhante à inscrição "AI" em suas pétalas, um símbolo de tristeza. No entanto, esta flor foi identificada com outra planta, o delfínio (larkspur), ou espora, ou uma íris (Iris attica), ou talvez o gladíolo italiano (Gladiolus italicus) ou a Scilla bifolia, além de algumas outras, em vez do que hoje chamamos de jacinto. Outros deuses da vegetação que foram outrora belos rapazes que morreram na flor da juventude e foram transformados em plantas incluem Narciso, Ciparisso, Mécon e Adônis.

hyakinthos, larkspur, Delphinium ajacis, Jacinto, Ajax

Segundo A. Hyatt Verrill em Precious Stones and Their Stories ("Pedras preciosas e suas histórias"), os antigos gregos associavam a Apolo uma pedra preciosa de um azul profundo ou violeta chamada jacinto. Recebeu esse nome porque sua cor lembrava a das flores do jacinto. Esta pedra seria considerada sagrada para Apolo devido à conexão mitológica. As pessoas que visitavam o santuário de Apolo, bem como seus sacerdotes e a suma sacerdotisa Pítia, seriam obrigados a usar esta pedra. Contudo, não consegui verificar a veracidade dessa informação em fontes antigas.

hyakinthos, larkspur, Delphinium ajacis, Jacinto, Ajax (2)

O termo 'cabelo jacintino' refere-se ao cabelo cacheado de Jacinto que lembra as pétalas enroladas das flores de jacinto. Muitas vezes é usado poeticamente. O termo também pode descrever a cor do cabelo, violeta escuro ou profundo. Na Odisseia de Homero, Atena dá a Odisseu cabelos jacintinos para deixá-lo mais bonito. Edgar Allan Poe, no poema “To Helen” ("A Helena"), usa o mesmo termo para destacar a beleza do cabelo de Helena de Troia.

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Fonte (com acréscimos)

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