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27 fevereiro 2019

O Falo de Deus: a relação homoerótica entre Deus e os homens

Sagrado Masculino, Falicismo, Falismo, Falo, Deuses Fálicos, Homossexualidade e Judaísmo, Homossexualidade e Cristianismo - God’s Phallus: And Other Problems for Men and Monotheism, Howard Eilberg-Schwartz - O Falo de Deus: E Outros Problemas para os Homens e o Monoteísmo

 Surpreendentemente, críticas sensíveis ao gênero do Deus judaico podem criar problemas para as noções de masculinidade.

No artigo a seguir, o autor apresenta a tese de seu livro, God’s Phallus: And Other Problems for Men and Monotheism (O Falo de Deus: E Outros Problemas para os Homens e o Monoteísmo, numa tradução livre). Com base em sua leitura de fontes judaicas, ele argumenta que há uma tensão entre o privilégio da tradição judaica de heterossexualidade (e procriação) e a relação entre Deus e os homens judeus, que contém elementos homoeróticos. Este artigo é adaptado e reimpresso de God’s Phallus (O Falo de Deus), publicado pela Beacon Press.

O título deste livro (God’s Phallus) é chocante porque o pensamento de Deus ter um pênis é chocante. A maioria dos judeus e cristãos pensa em Deus Pai como carente de um corpo e, portanto, além da sexualidade. Sem um corpo, Deus obviamente não pode ter órgão sexual.

Sagrado Masculino, Falicismo, Falismo, Falo, Deuses Fálicos, Santos Fálicos - Moisés Erigindo a Serpente de Bronze, de William Blake
Moisés Erigindo a Serpente de Bronze,
de William Blake (c. 1801-3)
Mas de onde vem a ideia de um Deus desencarnado? E se, historicamente falando, for o desconforto com a ideia do pênis de Deus que gerou a ideia de um Deus incorpóreo? E se esse mal-estar fluir das contradições inerentes ao relacionamento dos homens com um deus que é explicitamente masculino? Em poucas palavras, este é o argumento deste livro.

É por isso que o título God’s Phallus é um assunto sério que aponta para questões interessantes sobre a natureza dos símbolos religiosos e a maneira pela qual as questões de gênero, sexualidade e desejo são inseparáveis ​​delas. Mais especificamente, este é um livro sobre a paternidade divina e as maneiras pelas quais o corpo sexual de um deus paterno incomoda a concepção de masculinidade.

Pode, é claro, parecer contra-intuitivo pensar em um deus masculino como sendo problemático para a concepção de masculinidade. Afinal, dezenas de estudos feministas nos últimos vinte anos exploraram a maneira pela qual imagens de deidades masculinas autorizam a dominação masculina na ordem social. Como esses estudos demonstraram bem, um macho divino legitima a autoridade masculina e deifica a masculinidade. Assim, pode parecer paradoxal considerar que o símbolo de um deus masculino gere dilemas para a concepção de masculinidade.

No entanto, eu diria que, ao mesmo tempo em que tal símbolo funciona para legitimar a masculinidade, que pode de fato ser sua função primária e até original, ela também torna instável o significado de masculinidade. Este livro explora como as tensões decorrentes da ideia do corpo sexual do Deus Pai são expressas no mito e no ritual de uma tradição religiosa, a saber, do antigo judaísmo.

Idolatria do Bezerro de Ouro
Idolatria do Bezerro de Ouro (autoria desconhecida).
Símbolo da potência masculina na maioria das
religiões da região, o culto ao boi/touro representava
o pecado da idolatria punido por Javé
Então, quais são os dilemas evocados pela masculinidade de Deus no judaísmo antigo? O primeiro é o homoerotismo: o amor de um homem humano por um Deus masculino. A questão do homoerotismo surge no antigo Israel, porque a relação divino-humano é frequentemente descrita em termos eróticos e sexuais. Casamento e sexualidade são metáforas bíblicas frequentes para descrever o relacionamento de Deus com Israel. Deus é imaginado como o marido de Israel, a esposa; núpcias e até mesmo relações sexuais são metáforas para o pacto. Assim, quando Israel segue outros deuses, "ela" é vista como uma prostituta. O relacionamento de Israel com Deus é, portanto, conceituado como uma relação sexual monogâmica e a idolatria como adultério.

Mas as metáforas heterossexuais nos textos antigos desmentem a natureza da relação em questão: são os homens humanos, não as mulheres, que são imaginadas como tendo as relações primárias íntimas com a divindade. O Israel que é coletivamente imaginado como uma mulher é na verdade constituído por homens, homens como Moisés e os patriarcas. E esses homens amam, de maneiras erótica e sensualmente imaginadas, uma divindade masculina.

Isso não teria colocado um problema se a masculinidade humana não estivesse tão fortemente associada à procriação no judaísmo antigo. Ser um homem na antiga cultura israelita envolvia casar, ter filhos e levar adiante a linhagem do pai ou da tribo. Assim, o conceito de masculinidade do judaísmo antigo estava profundamente enredado em imagens do que hoje é chamado de heterossexualidade.

Ainda outro conjunto de dilemas é gerado pela imagem monoteísta de um Deus Pai sem sexo. Como tem sido apontado por muitos intérpretes, o Deus dos judeus, ao contrário dos deuses do antigo Oriente Médio e muitas outras tradições religiosas, não tem relações sexuais ou produz filhos, pelo menos na literatura que fez o seu caminho para a Bíblia hebraica. O registro arqueológico sugere que muitos israelitas podem ter imaginado a deusa Asherah como parceira de Javé (Yahweh), mas na Bíblia hebraica e na variedade de judaísmos que floresceram posteriormente, Israel imaginou Deus como não tendo parceiras sexuais.

Apesar do fato de que Deus metaforicamente se casa (Oseias 1-2 / Jeremias 2:2), e até tem relações sexuais com a entidade Israel (Ezequiel 16:8), que é imaginado como mulher, essa união metafórica difere das uniões de divindades masculinas e femininas encontradas na mitologia de muitas outras tradições religiosas.

A assexualidade [N/T: isto é, seu caráter como assexuado] do Deus Pai era problemática em uma cultura definida pela descendência patrilinear. Esperava-se que um homem se reproduzisse, continuasse sua linhagem, mas também se entendia que ele era feito à imagem de um Deus que era essencialmente celibatário.

Homossexualidade na História - A Criação de Adão, de Michelangelo, Teto da Capela Sistina
EU TE AMO
mas, por favor, se eu te vir olhando tanto assim para outro deus eu quebro teu pescoço
Texto de God’s Phallus, por Howard Eilberg-Schwartz. Tradução do dono deste blog.

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