Aviso aos nossos inimigos:

"Pereçam miseravelmente aqueles que pensam que estes homens fizeram ou sofreram algo vergonhoso." (Filipe II da Macedônia sobre o Batalhão Sagrado de Tebas, o Exército de Amantes)

20 janeiro 2023

Androfilia no Peru Antigo

Homens nus, Machu Picchu, Peru, Nudismo

 Algumas evidências de comportamento homoerótico no Peru pré-colombiano sobreviveram desde a conquista espanhola na forma de cerâmica erótica (espanhol: huacos eróticos) e de relatos registrados pelos europeus. Essa cerâmica se originou de várias civilizações antigas do Peru, sendo as mais famosas as das culturas moche (ou mochica) e chimu. Já quanto aos relatos espanhóis, a veracidade de seus registros fica comprometida com o viés homofóbico dos seus cronistas cristãos.

O Império Inca

Segundo o cronista Pedro Cieza de León, ao contrário do resto do Império Inca, a prática homoerótica era tolerada no norte do império (região de Chinchaysuyo) e até considerada um ato de adoração, existindo um bordel masculino que atendia às necessidades da tropa. Esses servos sexuais eram conhecidos como pampayruna.

Cerâmica chimu
Cada templo principal ou santuário tem um homem, dois ou mais dependendo do ídolo, que se vestem de mulheres, e com estes, quase por via de santidade e religião, os senhores e principais têm seu ajuntamento carnal.

— Crônica do Peru (1540-1550) de Pedro Cieza de León

No entanto, no centro e sul do império, os incas puniam severamente o homoerotismo. O cronista Martín de Murúa comentou em sua História Geral do Peru que o inca ("rei") Lloque Yupanqui (que reinou muito antes da chegada dos espanhóis, de 1260 a 1290) punia "com grande severidade os pecados públicos — roubar, matar — e a sodomia , pelos quais prendia, arrancava as orelhas e o nariz e enforcava, e aos nobres e principais cortava o pescoço ou rasgava a camisa".

O inca Garcilaso de la Vega (que era mestiço incaico-espanhol e cristão) relata em seus Comentários Reais dos Incas que o homoerotismo no Império Inca era proibido e que os "sodomitas" eram perseguidos e queimados vivos.

Eles descobriram que havia alguns sodomitas, não em todos os vales, mas em quais e quais, nem em todos os vizinhos em comum, mas em alguns indivíduos que usavam secretamente esse vício maligno... O inca ficou feliz com a história da conquista... E em particular, ele ordenou que a investigação dos sodomitas fosse realizada com grande diligência e que aqueles que fossem considerados não apenas culpados, mas iniciados, por menores que fossem, fossem queimados vivos em praça pública... Eles também queimavam suas casas e as demoliam e queimavam as árvores de suas propriedades, arrancando-as... e proclamavam por lei inesquecível que a partir de então eles se protegeriam de cair em tal crime, sob pena de pelo pecado de um todo o seu povo seria devastado e todos os seus habitantes queimados em geral.

— Comentários Reais dos Incas (1609)

Por sua vez, Cieza de León comentou em sua Crônica do Peru que os incas puniam aqueles que praticavam o homoerotismo: "Eles odiavam aqueles que o usavam, desmerecendo-os como vis avergonhados e que se eles soubessem que alguém havia cometido tal pecado, eles o puniam com tal pena que ele seria apontado e conhecido entre todos."

Chegada dos espanhóis e proibição da homossexualidade

No século XVI, os povos originários da América fizeram contato com os europeus que chegaram ao nosso continente. Na região do atual Peru, os espanhóis ficaram surpresos com as práticas sexuais dos nativos. O vice-rei Francisco de Toledo e os padres ficaram horrorizados ao descobrir que o homoerotismo era aceito e que a população indígena também não proibia o sexo antes do casamento nem considerava a castidade feminina de particular importância.

Homem felando (realizando felação em) outro homem
O historiador Máximo Terrazos descreve como os espanhóis reconciliaram essa sexualidade nativa com a fé católica:

Toledo ordenou que os nativos fossem evangelizados e aqueles "pegos coabitando fora do casamento sancionado pela igreja receberiam 100 chibatadas com um chicote 'para persuadir esses índios a se afastarem desse costume tão prejudicial e pernicioso'. Toledo também emitiu vários decretos destinados a criar segregação quase total dos sexos em público. Violações eram punidas com 100 chicotadas e dois anos de serviço em hospitais estatais pestilentos. Sob a Inquisição, trazida ao Peru em 1569, os homossexuais podiam ser queimados na fogueira."

— Maximo Terrazos, historiador

Dois homens se felando mutuamente
Existem testemunhos de alguns cronistas das Índias sobre o comportamento homoerótico entre os incas. Gonzalo Fernández de Oviedo comenta sobre isso em sua História Geral e Natural das Índias. Por sua vez, Pedro Cieza de León menciona em várias ocasiões o "hediondo pecado de sodomia" em sua obra Crônica do Peru:

E nestes outros, por ter o demônio mais aprisionado nas cadeias de sua perdição, certamente é verdade que nos oráculos e santuários onde eram dadas as respostas, ele dava a entender que era conveniente para o seu serviço que alguns moços fossem estar nos templos desde a infância, para que, às vezes e quando os sacrifícios e festivais solenes fossem feitos, os senhores e outros principais usassem o maldito pecado da sodomia com eles.

— Crônica do Peru

No entanto, a homossexualidade no Peru foi descriminalizada em 1837.

Cerâmica moche e chimu

Cerâmica moche
Ao longo de um período de mais ou menos mil anos (entre 300 AEC e os 700 DC), as culturas andinas centrais pré-colombianas, especialmente os moche e os chimu, criaram pelo menos dezenas de milhares de cerâmicas (huacos). Algumas dessas cerâmicas mostram esqueletos inegavelmente engajados em atos sexuais entre iguais; quatro retratam penetração anal entre homens. Muitos outros mostram parceiros onde pelo menos um membro é de sexo indeterminado, como a cerâmica de felação (sexo oral no pênis) mostrada ao lado, onde a genitália da pessoa de joelhos não é visível. Tais trabalhos, talvez devido ao viés heterossexista, muitas vezes foram interpretados como retratando um casal "heterossexual" (como no caso da cerâmica ao lado, que, por causa de sua trança, há quem diga a pessoa ajoelhada se trata de uma mulher).

Algumas peças apresentam homens com falos imensos e eretos com abertura na ponta da glande por onde derramar os líquidos rituais, em reconhecimento ao poder mágico do sêmen como força fertilizadora da natureza.

Destruição

Muitas das cerâmicas, junto com a maioria dos ícones indígenas, foram destruídas. Na década de 1570, Toledo e seus conselheiros clericais se organizaram para eliminar a sodomia, a masturbação e uma prática social comum que traduzida aproximadamente do quíchua nativo significa "casamento experimental". Como descreve Terrazos, "você não podia falar sobre essas coisas porque eram consideradas [pornográficas]". Elas foram proibidas devido ao "tabu imposto pela religião cristã de que os homens fazem sexo apenas para procriação e que as mulheres não experimentam prazer sexual".


Sobrevivência

Apesar desse esforço organizado para destruir esses artefatos, muitos sobreviveram até os dias atuais. Durante décadas, as cerâmicas eróticas peruanas pré-colombianas foram mantidas fora do alcance do público, acessíveis apenas a um grupo de elite de cientistas sociais peruanos. Ocasional e relutantemente, elas foram disponibilizadas para pesquisadores estrangeiros selecionados dos Estados Unidos e da Europa. O Museu Larco em Lima, Peru, é conhecido por sua galeria de cerâmica erótica pré-colombiana (onde, infelizmente, só exibem online peças eróticas "heterossexuais").

Sexualidade sagrada

Na arte do Peru antigo, as atividades sexuais são representadas entre os seres que habitam esta terra (Kay Pacha), mas também as interações sexuais com os habitantes do mundo inferior (Uku Pacha), os ancestrais. Nessas interações associadas ao Uku Pacha, a intenção parece ser a propiciação e a excitação dos ancestrais, a emissão do sêmen, o escoamento de um líquido que poderia simbolizar a vinda das águas, necessárias para garantir a fertilidade da terra.

O homem é representado como um emissor, um fertilizante, projetando sua virilidade e poder. O homem também toca, acaricia, beija, assim como é tocado, acariciado e beijado. Ele também é representado como um receptor passivo das ações propiciatórias de seus parceiros, especialmente quando é apresentado como um habitante do mundo inferior, com características cadavéricas, situação que não é a causa de sua incapacidade sexual. Pelo contrário, os ancestrais claramente não são considerados "mortos" ou inativos, mas são os seres que devem vitalizar a terra por dentro.

Homem do mundo inferior
masturbando seu pênis gigante
Quando os mortos acordam e sobem para o mundo terreno (Kay Pacha), e a divindade passa do mundo superior (Hanan Pacha) para o mundo inferior (Uku Pacha), a penetração anal (em homem ou mulher) deve ser praticada, porque a ordem foi invertida. Os mortos se levantam de seus túmulos, tocam música, dançam e ajudam a divindade a passar do mundo terrestre para o mundo inferior, empurrando a cabeça e puxando os pés.

As cenas de felação (sexo oral no pênis) e de masturbação masculina estão relacionadas a rituais de oferenda, que buscam promover a fertilidade da terra ao estimular o sêmen a sair do pênis e com ele regar a terra.

A peça ao lado, um vaso escultural de cerâmica, mostra um indivíduo cadavérico do sexo masculino, habitante do mundo inferior, sexualmente ativo (na cosmovisão andina, aqueles que consideraríamos mortos ainda seguem com força vital e ativos no mundo interior). Seu pênis é representado com dimensões exageradas, enfatizando a capacidade desse personagem de ser emissor de sêmen e, portanto, fecundador. A sua vitalidade manifesta-se na possibilidade de continuar a fecundar, como se vê nesta peça em que o homem cadavérico se masturba para emitir o sêmen fecundante.

Cena de penetração anal entre homens
Infelizmente eu não consegui encontrar estórias de deuses ou heróis míticos peruanos antigos que amam o mesmo sexo. Se eles existiam para suas culturas, devem ter sido apagados da espiritualidade e da história do Peru pelo genocídio cultural (e humano) perpetrado pelos piedosíssimos cristãos.


Fontes:


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